sexta-feira, 13 de abril de 2012

Mate uma pessoa e ganhe uma terapia grátis

Escusas de explicar que o artigo que se desfolha sobre os olhos do leitor teve inspiração imediata nos casos extraordinários da realidade ordinária. Doceira que tentou matar adolescentes com brigadeiro envenenado vai passar por tratamento psicológico. E a frase que me veio à mente foi como um daqueles letreiros fosforescentes de Las Vegas: “Mate uma pessoa e ganhe uma terapia grátis”.
Que me perdoem os profissionais da lei e da psicologia, a quem minhas considerações não passam de um simplismo insuportável, mas confesso que me sinto preterida pela sociedade onde vivo. Sabendo o quanto custa uma terapia pela qual todo mundo, um dia ou outro, desejou ter cacife e tempo pra fazer, me parece um tanto inusitado, para não dizer injusto, que uma pessoa tasque o tal tratamento “na faixa”, depois de uma tentativa de assassinato premeditada e por motivo fútil: a prorrogação de uma festinha de aniversário, para a qual a assassina já teria recebido o pagamento e gasto o dinheiro sem ter preparado os doces. Que me desculpem os acadêmicos a simplicidade cortante de meu diagnóstico, mas o que leva alguém a cometer tal crime com tamanha frieza é doença ou é maldade? De onde vem essa nossa ânsia de agora de rotular com nome de doença o que para mim não passa de doença moral? Se uma criança não pára em sala de aula e não obedece ninguém, ela não é sem educação. Ela é doente, é hiperativa. Se uma pessoa mata outra, também, a maioria das vezes, alega transtornos mentais. Mas ainda não inventaram transtorno mental que deixasse a pessoa obcecada em ajudar os outros. “Fulano não pode ver ninguém precisando de ajuda, que é batata: já abre a carteira”. Alguém já presenciou esse tipo de desordem mental? Se já, por favor me avise.
O egocentrismo e a ausência de sentimentos ajudam a moldar uma sociedade psicopata, onde comportamentos antes condenados são não apenas plenamente aceitáveis como até admirados e desejáveis, como sinônimos de intrepidez nos negócios, espírito de luta e de vitória, esperteza. Não tem problema passar por cima de tudo e de todos, em nome da competitividade, se o que importa é ser bem sucedido e estar no topo. É a lei de mercado, a vida é essa. Não importa se o lugar de destaque na mídia foi conquistado a troco de mentiras e apelações. “Ela é esperta, sabe lidar com as armas que tem”, dirão.
Aos poucos, as pessoas não percebem que estão ajudando a reforçar um comportamento predatório que não age altruisticamente, não age pelo que é certo e justo, mas apenas em nome do que é vantajoso. Numa sociedade assim, a vida não é respeitada.
Constato, tristemente, que embora os brasileiros sejam tão famosos pelo otimismo e por amarem a vida, a despeito das adversidades, a vida, no Brasil, não tem valor.
Familiares do brasileiro morto na Austrália reclamavam, esta semana, não da postura das autoridades australianas, segundo eles, protegendo obviamente os próprios interesses, mas das autoridades brasileiras no país, que não fizeram e que não estariam fazendo nada para solucionar o caso e torná-lo o menos doloroso possível para a família.
Será que o nosso governo valoriza a vida do indivíduo brasileiro ou só dá importância a números brutos e absolutos?
Leio matéria divulgada na edição de hoje do Diário da Região, que diz: “Dengue mata e a Prefeitura ‘comemora’”. Segundo o jornal, nota da Prefeitura de Rio Preto considerou vantagem ter ocorrido “apenas uma morte” em 2011 e uma agora. E eu pergunto: a vida de uma pessoa não tem valor? Ou só tem valor se esta única pessoa tiver milhões no banco?
Vamos comparar com a realidade em outros países. Certamente que há países onde a vida humana é ainda bem menos respeitada que no Brasil, mas se a intenção é melhorar é preciso mirar os melhores exemplos. Sem entrar nos pormenores da guerra, é fato notório, avalizado por membros da comunidade judaica, inclusive a do Brasil, que “todo soldado israelense SABE que seu país não medirá esforços para resgatá-los caso caiam nas mãos do inimigo, no que seria uma ratificação do profundo respeito de Israel à vida humana e para os caídos”. E o texto vai além: “Este princípio emana do senso de moralidade de Israel assim como da ética judaica. Trata-se de uma demonstração do poder físico e moral de Israel”.
Em cena de um especial para TV, o presidente John Kennedy, em reunião com o presidente russo, tenta persuadi-lo de que era preciso evitar o confronto. Como argumento, o fato de que muitas pessoas perderiam a vida. O presidente russo teria respondido: “O que só vai provar que nós, russos, somos muitos”.
Vou acreditar no governo que valorizar a vida de cada ser humano e não no fato de sermos muitos. Vou dar valor ao governante que enxergar a infinita potencialidade do indivíduo e na perda incomensurável que se tem a cada criança desperdiçada nas ruas e que poderia se tornar um adulto de sucesso, contribuindo, com o seu talento, para o desenvolvimento do país, provando que o verdadeiro exército é o “exército de um homem só”.
A vida de uma única pessoa precisa ser valorizada. Do contrário, continuaremos assistindo ao massacre de milhões nas estradas, em assaltos e pela forma mais vil: a corrupção.
Ainda há muito que fazer. Por enquanto, quando se tira uma vida, ainda é possível ganhar terapia, receber uma punição branda ou nem isso. Afinal, é apenas UMA vida. Quem liga?

Um comentário:

  1. Pis é, Adriana, eu sempre fico com isso n cabeça: quando alguém comete um crime - seja ele qual for - sempre vem alguém com essa história "ah..ele é doente, tem problemas mentais, disso, aquilo ou aquilo outro..."
    Quer dizer que os políticos desse País - sem generalizar - são todos doentes? Pobre coitados...
    Falta é lei para valorizar o ser humano, para valorizar a vida, como você bem disse, pois, hoje, tratam a vida como qualquer coisa de mero valor. E estar vivo não tem preço.
    Talvez a realidade só mude quando as mortes cheguem na casa dos 'doutores da lei'.

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